quarta-feira, 13 de novembro de 2013

"Tenha o seu amor de volta!"

"Trago seu amor de volta com a alta magia da amarração infalível grátis  Isso mesmo infalível, não sendo possível ninguém descobrir e nem reverte. Mandamos fotos e videos de todo o seu trabalho de amarração infalível para total acompanhamento..."


As páginas dos jornais e revistas andam repletas de anúncios de pretensos videntes, médiuns raros que, entre outras coisas, garantem que trazem de volta um amor perdido.

Eles chamam-se a si próprios Mestres, Professores, Mães e Pais, Gurus. Alguns não vão tão longe e são apenas Magos ou mesmo Bruxos. Não tenho nada contra a proliferação dos credos e de quem os segue, seja por fé religiosa, pela esperança duma vida melhor, ou por crença inabalável no dinheiro dos outros. Posso ser contra algumas práticas menos ortodoxas, começando pela exploração da dor alheia e pelo sacrifício cruel de animais (existe sim!). Não vou por aí hoje.

O que eu não compreendo é como é que alguém há-de querer de volta, seja por feitiço ou amarração ou outra coisa qualquer que o diabo invente e o homem execute, alguém que não quis ficar do seu lado, alguém que partiu de moto próprio desprezando quem o(a) amava? Então, vamos supor que a amarração resulte (que eu não brinco com certas entidades): mas quem é quer um zombie em casa? Quem é que quer ser pseudo amado por um(a) "coisa" sem vida própria, uma marionete com olhos de carneiro mal morto, depois de sujeito àquelas práticas?

Era certamente mais correto que aqueles magos (?) simplesmente prometessem: o seu amor foi embora? Venha que eu ajudo a esquecer mais depressa!

Já que estes mestres do oculto se fazem pagar bem, eis aqui um volte-face de marketing. inventem lá o despacho para descanso dos corações despedaçados e soprem o objeto de amor não correspondido ou desprezado para o continente dos cangurus, bem longe da vista e ainda mais do coração. Assim, duma só vez e celeremente, sem o apoio do tempo que tudo faz esquecer (dizem!), mas é somente um sádico porque demora muito a exercer o seu míster e a imagem, as memórias passadas com o ser amado mas não amante, vão devagarinho, devagarinho...

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Perfeito! Ideal, ou outra pessoa no horizonte...

Após 10 anos de vaguear pelo mundo fora, um homem, resolveu voltar à sua aldeia natal.
Um velho amigo que o reconheceu, imediatamente lhe perguntou curioso:
- Então, pá, encontraste a mulher perfeita nas tuas andanças?
O homem respondeu, sonhador, a memória perdida algures:
- Lá no sul encontrei uma mulher linda, com olhos de pérolas, cabelo de trigo e sereia, o corpo de uma deusa.
O amigo, entusiasmado, perguntou:
- E então, onde está ela, veio contigo?
- Infelizmente não era perfeita, pois era muito pobre. Não era a mulher ideal para mim
- Oh. E então?
- Então fui para o norte e encontrei uma mulher que era a mais rica da cidade. Era tudo dela.
Não tinha nem noção do poder e dinheiro que tinha.
- Então essa era perfeita. Veio contigo?
- Não, também não, - respondeu o homem, - tinha um defeito. Sabes, nunca tinha visto criatura mais feia em toda a minha vida...
- E depois? – insistiu o amigo já com algum desânimo.
- Finalmente, rumei a oeste e conheci uma mulher encantadora. Bela como uma sereia e tinha muito dinheiro. Era perfeita.
- Ah então ela veio contigo, já não a largaste mais, não é amigo?
- Não. Porque, infelizmente, ela também procurava o homem perfeito.





Encontrei esta história na net há algum tempo e achei-a… perfeita. Quase nem era necessário dizer mais nada sobre a incessante e infrutífera busca do ser humano pelo outro ser humano perfeito e ideal que encaixa em si. Com perfeição.

Muitos desperdiçam a vida nessa busca. Tenho para mim que não há pessoa mais infeliz que aquela que passa o tempo com a cabeça voltada para olhar por cima do ombro à procura do seu ideal e não vê o que tem na sua frente, e muitas vezes ignora quem está ao seu lado. Enquanto isso, a vida acontece-lhe.

Mas o que é o ideal? Quem é a pessoa perfeita senão um protótipo, uma ilusão, uma imagem surrealista que a mente criou, quiçá à imagem de si própria, ou de alguém que foi amado e por algum motivo saiu da sua vida sem dizer todas as palavras que deviam ser ditas?

Na maioria das vezes, quer numa, quer noutra situação, o ideal é deceção. E aqueles que buscam nem sequer dão uma chance a um novo relacionamento, a uma nova pessoa que possa aparecer. Esse ideal é tão pesado, tão prepotente na sua existência mentalizada, memorizada e intrinsecamente idealizada, que invariavelmente nem deixa continuar o que mal começou. O ideal é uma armadura, do mais puro ferro, que mesmo pesado e ferrugento os isola da realidade. Da realidade exterior e da sua própria realidade.

Voltam o rosto para todos os pontos cardeais na sua busca incessante. Iludidos de que a qualquer momento a tal pessoa certa, vai pular a cerca e chocar com eles. Não podem perder tempo com mais ninguém, têm de estar disponíveis para a sua princesa ou príncipe encantado. Passam a vida a saltitar de relação em relação com a mesma elegância e suavidade com que um elefante saltaria de nenúfar em nenúfar.

Ao primeiro problema, enfastiam-se, porque não sendo a pessoa ideal, todos os contratempos são irresolúveis, muros insuperáveis que com a sua musa/fauno encantado nunca teriam. Por isso, aquela é a pessoa errada. Rompe-se mais uma relação sem perceber que o errado é apenas diferente e não há tempo nem paciência para conciliar diferenças, porque a pessoa ideal está ali na esquina à espera e lá vão por ela, na sua senda quixotesca, deixando atrás de si e levando consigo nada mais que frustração e desilusão. Às vezes voltam para trás. Mantêm relacionamentos do tipo “vou ali e já venho, na verdade vou só ver se aquela/e é melhor do que tu, e se não for, volto e depois logo se vê”. Ou então, passa o pouco tempo de permanência numa relação a tentar anular a personalidade do outro/a e a fazê-la renascer como fénix, ideal e perfeita/o. Porque o cabelo precisa dum corte e doutra cor, porque se tem vestir desta e daquela maneira, porque tem de fazer o que ele/a diz sob pena de amuar, porque é gorda/o ou magra/o demais, porque tem de o/a acompanhar a todo o lado, quer lhe interesse quer não, claro que tudo isto sempre no interesse do outro, para que ele melhore. Não interessa onde ficou aquela personalidade cativante que inicialmente lhes chamou a atenção. O que é preciso é que seja igual àquela imagem idolatrada que colocamos num pedestal da memória.

- Vida própria? Qual vida própria? Então o ideal não é estar sempre juntos? Ah, não? Então adeus que não és o meu ideal!

E aquele/a que fica para trás ou se deixa enganar numa relação iô-iô acaba mergulhado, atolado, afogado em baixa auto-estima, porque pior do que saber que não se é a pessoa certa para alguém, é saber que, algures, em algum horizonte por mais longínquo que seja, há alguém melhor que nós para aquele/a que amamos.

Chega! Nós os que ficamos para trás temos de ter a coragem e o discernimento de dizer basta, de gritar não! Porque somos reais de carne e osso e não viemos de nenhum conto de fadas ou de alguma imaginação fértil e delirante. Porque amamos e nos emocionamos, porque temos defeitos e virtudes mas estamos ali, no aqui e agora e não num horizonte distante, ou num qualquer vislumbre por cima do ombro. É a nossa mão que ampara a deles, o nosso abraço que os sustenta, somos palpáveis, não desenhos animados. E porque merecemos que nos vejam como somos e quem somos.

Aquele/a que busca um ideal, não tem amor para dar, quem sabe amar não idealiza o outro, não o mistifica. Aquele/a que busca um ideal apenas se frusta a si mesmo e perde a vida que passa indiferente. Porque aquele/a que busca o ideal também não é perfeito para ninguém e no seu horizonte não há musas nem faunos encantados, apenas a solidão estéril aguarda. E um coração deserto.