domingo, 21 de novembro de 2010

Estação da Perda

"Do not run through life
so fast that you forget
not only where you have been
but also where your are going
.../..."

Pravsworld

Temos alturas na vida em que parece que caminhamos sob o sol, outras em que supostamente há uma nuvem privativa sobre a nossa cabeça (qual desenho animado) e que em qualquer momento vai chover e trovejar em cima de nós, (só de nós!).

Temos momentos em que talvez nos apetecesse virar bela adormecida (Hélas! Sem príncipe nem sapo que nos contente!) e ficar assim durante o tempo necessário para que tudo o que nos causa dor passe, e outros ainda em que nos apetece deixar de existir. Ter uma vara de aveleira, sacudir, fazer puuuff e desvanecer no ar.

Que devemos fazer nestas alturas, em que a comichão nos ataca a alma e a raiva nos corrói o coração? Em que somos nós contra o Mundo e todo o mundo? Fugir para outro país? Não chega, é perto. Mandar parar a Terra porque queremos descer? Desiludam-se, o mundo não pára por ninguém, nem dá prioridade a quem pensa que é a sua maior atracção. Comer até rebentar de gases? Incómodo, ruidoso e doloroso. Serrar o vizinho ao meio com a faca de cortar pão? Sangrento. Sair para a rua e dar um estalo no primeiro que aparecer com uma cara que não gostamos, em especial os que nos parecem felizes? Ou ser generosamente pérfido e distribuir pontapés a eito? Pode ter consequências perversas no reverso da medalha. Com a nossa sorte do momento, ainda nos sai um 3º dan em artes marciais. Mas apetece às vezes, não apetece? Começar uma discussão com alguém de quem gostamos? Não, não é para embirrar, é só para nos sentirmos vivos e confirmar que ainda há alguém que nos ouve e nos liga. Arrepelar cabelos de qualquer sítio do corpo? E pegar fogo no mundo, nunca vos apeteceu?

De vez em quando erramos o comboio e saímos na estação da perda. E voltar a sair de lá é que é o diabo. Dói que se farta. Não são apenas dores. É crescimento. E crescer, toda a gente sabe, dói imenso. Medimos a vida em dias, meses, anos… Mas a alma às vezes tem pressa e quer tudo já. Ontem, já era tarde. Por isso nos enganamos na estação.

Mas, porque é que medimos o tempo? Porque é que a matemática da nossa vida se limita a contar anos, nãos, fracassos, desamores, traições, infelicidades, pernas e cabeças partidas, feridos e mortos? Porque não passamos a contar também amores, alegrias, beijos, abraços, sorrisos, amigos? Porque não medimos também a vida pelo que sentimos de bom ao invés de contar somente maldades? Porque passamos a vida a pensar que somos espectadores e esquecemos que estamos no palco? Façamos como o poeta*, quando nos perguntarem que idade temos, vamos responder: “tenho três amigos, oito paixões, quatro tristezas, três grandes amores e dezenas de prazeres”. Prefiro ser a mão que pinta do que a tela em branco, a voz que canta do que a pauta com a melodia, a actriz do que a espectadora na minha vida.

Quantos anos tenho? Poucos mas bons amigos, uma paixão, um amor triste, um grande amor pequenino, um amor que procuro e nao encontro mas é grande e vem decerto de muito longe, cinco grandes saudades, e muitos muitos prazeres.

*Mário Quintana é o meu poeta

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