segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Alguém

…/…
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração.

António Ramos Rosa,
Não posso adiar o coração



Quero alguém que seja fraco.
Suficientemente fraco para encostar a cabeça no meu peito e chorar se tiver de chorar,
Ou apenas descansar o cansaço do dia.
Quero alguém que seja leve.
Leve o suficiente para me criar borboletas na barriga e cócegas na alma.
Quero alguém que seja esperto.
Suficientemente esperto para ver o meu brilho quando eu me escondo de mim mesma.
Quero alguém orgulhoso.
Não importa quão alto salte na alegria, mas quão orgulhoso consegue caminhar depois de cair no chão.
Quero alguém que seja letrado.
Formado na vida, que saiba ler nos meus olhos e decifrar-me o coração.
Quero alguém que seja forte.
Forte o suficiente para me levantar, levar me até às nuvens e nunca me deixar cair.
Quero alguém que seja pesado.
Suficientemente maciço para suportar os embates da vida e ainda assim permanecer ao meu lado.
Quero alguém com raízes.
Fortemente enraizado na vida como um velho e altivo carvalho cuja sombra a todos refresca.
Quero alguém monstruoso.
Alguém que deixe sair à superfície o monstro enlouquecido da paixão e me inunde, me invada numa torrente de amor.
Quero um carcereiro.
Alguém que me amarre e me ancore à vida, me inspire, me motive, e me ame duma forma que eu nunca conheci antes.
Quero alguém que seja feiticeiro. Alguém que se veja nos meus olhos e perceba que é tudo o que eu sempre fui e quis ser.

1 comentário:

Armindo de Vasconcelos disse...

Um visão contrastante do(s) querer(es).

É um privilégio poder passear por estes bosques da ficção, como diz Umberto Eco.

Virei mais vezes. Gosto de explorar os sentires das palavras